Estudo mostra que mais da metade dos municípios do país não elegeram nenhuma vereadora negra em 2020

O estudo analisou a representatividade de mulheres negras e homens negros em relação às mulheres e homens brancos eleitos nas câmaras de vereadores em 2020 | Foto: Divulgação/FGV

De acordo com um relatório produzido pelo Núcleo de Justiça Racial e Direito da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (NJRD/FGV Direito SP), em parceria com a Coalizão Negra por Direitos, mais da metade dos municípios brasileiros (57,2%) não elegeu sequer uma vereadora negra (preta e parda) em suas câmaras municipais nas eleições de 2020. E 15,7% dos municípios não têm sequer um vereador negro (preto e pardo). Esse é um dos principais achados da pesquisa “Cidades, Raças e Eleições – uma análise da representação negra no contexto brasileiro”.

O estudo analisou a representatividade de mulheres negras e homens negros em relação às mulheres e homens brancos eleitos nas câmaras de vereadores em 2020. Num contexto de mudança de regras eleitorais para fomentar a inclusão de pessoas negras nas casas legislativas, esse estudo tem por objetivo apresentar como estão distribuídos no território nacional os representantes negros e negras que venceram as eleições de 2020 para a vereança.

Considerado o critério territorial, a pesquisa mostrou que dos 5.570 municípios brasileiros, 876 (15,7%) não possuem sequer um homem negro em suas câmaras de vereadores. Esse número é ainda mais alarmante quando observamos a quantidade de câmaras municipais sem mulheres negras: 3.184 municípios brasileiros (57,2%) não têm sequer uma representante negra em suas câmaras de vereadores. O número de municípios que não elegeu nenhum representante negro, seja homem ou mulher, soma 770 (13,8% do total).

A ausência de pessoas negras eleitas em grande parte das cidades brasileiras tem relação com o perfil racial da população desses municípios?

As câmaras municipais que não possuem vereadores negros ou vereadoras negras estão espalhadas por todo o país, e esse fenômeno não ocorre exclusivamente em municípios com baixo percentual de população negra presente. Ao contrário, a pesquisa mostra que há municípios com uma população majoritariamente negra e que não possuem sequer um vereador ou uma vereadora negra.

Para analisar mais detidamente a relação entre a porcentagem de pessoas eleitas por raça e gênero e a porcentagem da população de cada grupo nos municípios, utilizamos como instrumento o indicador de proporcionalidade.

Esse indicador nos permite compreender se, em determinado município, um grupo está sub-representado, sobrerrepresentado ou próximo da proporcionalidade. Neste último caso, a porcentagem de pessoas eleitas de um grupo seria igual (ou quase igual) à porcentagem da população desse mesmo grupo no município.

O indicador foi aplicado para todas as cidades brasileiras e o resultado está indicado nos mapas apresentados abaixo. A cor verde indica que há sobrerrepresentação de um grupo, ou seja, que o percentual de pessoas eleitas é maior do que o percentual de habitantes daquele grupo no município em análise. A cor amarela, por sua vez, indica a sub-representação; e a cor roxa indica os municípios que se encontram próximos da proporcionalidade.

Os mapas mostram que os homens brancos estão sobrrerepresentados em praticamente todo o território nacional, enquanto as mulheres negras estão sub-representadas em quase todo o país.

Em relação aos vereadores do gênero masculino, a sobrerrepresentação dos homens brancos prevalece e está espalhada por todo o território nacional, com ainda mais ênfase para as regiões Sul e Sudeste. Nos casos em que identificamos uma sobrerrepresentação dos homens negros (pretos e pardos), esse cenário aparece com mais destaque nas regiões Norte e Nordeste, e praticamente inexiste nas regiões Sul e Sudeste.

Do ponto de vista das vereadoras, há uma visível sub-representação das mulheres, particularmente das mulheres negras, tendo em vista a prevalência da cor amarela no quarto mapa.

Os mapas demonstram, portanto, a desigualdade entre pessoas brancas e negras eleitas para as câmaras municipais e evidenciam como o poder político está concentrado nas mãos dos homens brancos.

“Caso o acesso aos espaços formais de tomada de decisão política fosse igualitário do ponto de vista da raça e do gênero, seria esperado que a participação de cada um desses grupos nas câmaras municipais fosse semelhante às suas proporções na sociedade, pois não há um gênero ou uma raça naturalmente mais propensa ou apta a ganhar eleições”, explica Luciana de Oliveira Ramos, coordenadora da pesquisa.

A leitura dos mapas de proporcionalidade revela a inequívoca sub-representação de vereadoras negras no país, o que dificulta a conquista de direitos para esse grupo, que costuma ser um dos principais usuários dos equipamentos públicos municipais. Assim, a inclusão de mais mulheres negras na política institucional é um desafio do tamanho do nosso país.

Como foi feita a pesquisa

O estudo é uma nota técnica coordenada por Luciana de Oliveira Ramos e Thiago Amparo, professores e pesquisadores da FGV Direito SP, e com participação dos pesquisadores Luã Ferreira, Jessica Tavares, Juliana Fabbron, Nathalia Dutra, Regina Lopes, Ezequiel Fajreldines e Ivan Mardegan.

A equipe de pesquisadores dividiu a porcentagem de pessoas eleitas, considerando raça e gênero, pela porcentagem da população dos grupos em cada município. Os resultados acima de 1,1 indicam a sobrerrepresentação do grupo em relação à população local. Os resultados abaixo de 0,89 revelam a sub-representação. E são considerados próximos da proporcionalidade os resultados entre 0,89 e 1,09.

Os dados das eleitas e eleitos à vereança nas eleições de 2020 foram extraídos do site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os dados dos habitantes são os disponíveis no último Censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010.

Para ter acesso a pesquisa completa, incluindo todos os mapas, acesse o site.

Da Redação | Com informações da Fundação Getúlio Vargas


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