Indígenas do Espírito Santo querem Renova fora de negociação

Cerca de 300 índios de aldeias de Aracruz estiveram na Assembleia em busca de apoio nas indenizações pelo rompimento da barragem da Samarco em Mariana (MG)

Deputados receberam documento em que indígenas questionam fundação criada para reparar danos | Foto: Ellen Campanharo

Cerca de 300 índios das etnias tupiniquim e guarani, originários das aldeias de Aracruz, litoral norte do Espírito Santo, lotaram a galeria do Plenário Dirceu Cardoso na tarde desta segunda (18).

Eles fizeram um protesto contra a Fundação Renova a quem acusam de promover a discórdia entre os índios e de firmar acordos arbitrários nas indenizações das famílias atingidas pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (MG), tragédia ocorrida em novembro de 2015.

Com o rompimento, a lama de rejeitos de minério contaminou o Rio Doce por mais de 600 quilômetros, numa bacia hidrográfica que abrange 230 municípios em extensão que vai de parte de Minas Gerais até o litoral capixaba.

Criada pelas empresas Vale, Samarco e BHP Billiton, responsáveis pela Barragem de Fundão, a Renova tem como missão promover as indenizações às famílias atingidas pela tragédia, além de recuperar a extensão do Rio Doce poluída pela lama.

Tribuna

O presidente da Casa, deputado Erick Musso (Republicanos), suspendeu a sessão ordinária para que os caciques Vilmar Benedito de Oliveira e Paulo Vicente de Oliveira pudessem usar a tribuna; eles entregaram posteriormente a Erick Musso um documento em que relatam várias posturas da Renova classificadas como ilegais.

Os caciques pedem no documento, entre outras questões, que a Renova seja retirada do processo de negociação com os índios, e que as tratativas sejam feitas diretamente com o consórcio Vale, Samarco e BHP Billiton. Outra solicitação é no sentido de que sejam desconsiderados acordos individuais feitos com caciques, sem que houvesse diálogo amplo com todas as comunidades indígenas de Aracruz.

Segundo Vilmar, os próprios caciques que assinaram esses acordos reconheceram mais tarde que foram pressionados, mas têm medo de denunciar isso à Justiça. Ele denunciou ainda, que, devido à represália da Renova, famílias indígenas que se recusam a firmar esses acordos de forma isolada não estariam recebendo auxílio emergencial, ajuda financeira que a entidade teria a obrigação de conceder a todos, sem distinção.

Eles também apontam no documento que, nos acordos individuais firmados, a Renova descartou o Estudo de Componente Indígena (ECI), um levantamento que comprovaria os danos causados aos índios e ao Rio Piraquê-Açu contaminado por metais pesados levados pela lama de rejeitos da barragem rompida.

Morte e câncer

O cacique Paulo Vicente de Oliveira afirmou que, após a contaminação do Rio Piraquê-Açu pela lama de rejeitos da Samarco, índios têm  morrido de câncer provocado por metais pesados. Ele acusou a Renova, na suposta instigação da divisão entre os índios, de “destruir” as formas de organização dos tupiniquins e guaranis que vivem nas aldeias às margens do Piraquê-Açu.

Segundo Paulo Vicente, isso fere os artigos 231 e 232 da Constituição Federal, que reconhece como direito dos índios a sua organização social mediante costumes, línguas, crenças e tradições. O cacique apontou ainda que a contaminação do Piraquê-Açu não afeta os índios apenas na questão do sustento alimentar e do trabalho, mas fere também os povos indígenas em sua alma, já que há uma relação espiritual com o rio. 

Apoio dos deputados

Erick Musso manifestou solidariedade aos anseios dos povos indígenas e afirmou que a Renova foi constituída para servir de “muro” para proteger as empresas responsáveis pela tragédia ocorrida em Mariana. “Muito triste esse manifesto hoje aqui no Plenário justamente um dia antes da data em que se comemora o Dia do Índio (19 de abril)”, lamentou.

O presidente da Ales lembrou que além da Comissão Parlamentar Interestadual de Estudos para o Desenvolvimento Sustentável da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CIPE-Rio Doce), o parlamento estadual dispõe ainda da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos que pode dar andamento nas questões levantadas pelos caciques de Aracruz.

“Determino à assessoria da Mesa que providencie cópias para todos os deputados do documento entregue (pelos caciques) e entendo que temos de buscar formas de ajudar nessa causa, que é muito justa”, declarou.

A vice-presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos, Iriny Lopes (PT), observou que por meio do colegiado já realizou várias audiências sobre o assunto, mas disse que é preciso que o Parlamento e a sociedade continuem mobilizados para que a Justiça seja feita no caso dos capixabas atingidos pela tragédia da barragem de Mariana. “Além dos índios, temos outros ribeirinhos atingidos, assim como pequenos agricultores, empreendedores afetados no turismo e no desporto náutico”, observou.

A deputada citou que também a Câmara Federal esteve na Ales, por meio de uma comissão externa, criada para fazer um levantamento da situação dos atingidos pela tragédia. “É preciso que os responsáveis parem de usar a Renova para se esconderem e não resolverem nada”, advertiu Iriny.

Os deputados Dary Pagung (PSB), Janete de Sá (PSB), Renzo Vasconcelos (PSC) e Doutor Hércules (Patri) também manifestaram solidariedade à causa indígena relacionada à Fundação Renova e se dispuseram a ajudar na busca de uma solução para o impasse.  

Por Wanderley Araújo


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