Extinção de conselhos é alvo de críticas

Conselheiros querem revogação de decreto que extinguiu órgãos colegiados não criados por lei | Foto: Ellen Campanharo

É urgente encontrar um caminho que culmine com a revogação do Decreto Presidencial 9.759/2019 que extinguiu diversos órgãos colegiados na Administração Pública Federal. Esse foi o consenso dos participantes da audiência pública virtual realizada nesta sexta-feira (30) pela Comissão de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Espírito Santo(Ales).

A deputada Iriny Lopes (PT), integrante efetiva do colegiado, destacou que o governo federal vem sistematicamente tentando acabar com a representação popular na construção das políticas públicas e no controle social. “O objetivo é tornar os conselhos autoritários, hegemonizados pelo governo federal para impor suas políticas fascistas”, afirmou.

Ela explicou que o mencionado decreto acabou com conselhos, comitês, comissões, grupos e outros tipos de colegiados que tenham sido criados por decreto ou ato normativo inferior, inclusive, aqueles mencionados em lei caso a legislação não detalhe a competência e composição do colegiado.

“O PT ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF). O partido tentou mostrar que essa medida atenta contra o princípio democrático da participação popular e somente poderia se dar por aprovação no Congresso Nacional. O entendimento do STF, infelizmente, foi o de manter apenas os conselhos criados por leis específicas, algo que só poderia ser alterado por projeto de lei e não decreto presidencial”, disse.

Um dos convidados do encontro foi o deputado federal Helder Salomão (PT-ES), que reiterou que os conselhos não são apenas do governo ou da sociedade, mas mecanismos paritários para representar igualmente os interesses de ambos os lados. “É para garantir aquilo que sempre defendemos como instrumento importante de convivência das pessoas, grupos sociais e fortalecimento da democracia. Têm um papel estratégico, garantem o monitoramento, acompanhamento e fiscalização efetiva da sociedade sobre como as políticas públicas têm sido pensadas”, enfatizou.

Outra participante foi a vice-presidenta do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e presidenta do Instituto EcoVida Aldenora González, que reforçou as críticas à postura do governo federal. Para ela, há uma estratégia de esvaziamento e desmonte dos conselhos. “Existiam 87 ou 88 conselhos nacionais e cada um efetivando uma política pública. Para cada política tem que ter um conselho que monitore a política para ver se está bom ou ruim, se os gastos públicos estão sendo efetivados”, esclareceu.

González mostrou-se preocupada de que a extinção dos colegiados no âmbito nacional comece a se espalhar também para os Estados. “Em Rondônia aprovaram que o Conselho de Assistência Social não tem mais a competência de fiscalizar”, lamentou.

Segundo o presidente dos conselhos estaduais de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea-ES) e de Promoção de Igualdade Racial (Cepir-ES) Rosemberg Moraes Caitano, o decreto federal já vem impactando em estados e municípios. Ele apontou que há diferença de reconhecimento entre os conselhos deliberativos e os consultivos, pois os primeiros possuem mais estrutura para subsidiar a atuação deles.

“Hoje, nos 78 municípios, têm funcionado bem ou mal o conselho de educação, da criança e do adolescente, da assistência social e de saúde. Em apenas seis municípios têm igualdade racial e em apenas 12 têm o Consea. Daí a gente percebe a disparidade em nosso Estado entre os conselhos consultivo e o deliberativo”, salientou.

Ao final de sua fala ele sugeriu à deputada Iriny que encampe a criação no Legislativo estadual de uma Frente Parlamentar da Agroecologia e da Segurança Alimentar e Nutricional.

Em seguida os convidados responderam perguntas feitas pelo público que acompanhava a audiência pelo YouTube. Questionado sobre o “legado” do decreto presidencial, Rosemberg frisou que isso poderia ser notado, por exemplo, no retorno do Brasil ao chamado “Mapa da Fome”, publicação da Organização das Nações Unidas (ONU) que trata da segurança alimentar nos países. “Precisamos de conselhos legítimos, não fakes, onde a sociedade possa estar pautando as políticas públicas e não recebendo elas prontas. O legado não é bom, é uma má herança”, avaliou.

Já Aldenora González respondeu indagação sobre as tentativas do governo federal de promover mudanças no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), uma delas a troca do cadastramento presencial por um feito por meio de aplicativo de celular. “Hoje é uma declaração na frente de uma pessoa. É diferente do proposto de o cidadão responder em um aplicativo, imagine o tanto de fraude. Se tem no INSS, como não vai ter no CadÚnico? É um prejuízo enorme se passar”, garantiu.

Ao ser indagado sobre os resultados da Adin do PT no STF, Helder Salomão falou que, além da ação, também há vários Projetos de Decreto Legislativo (PDLs) tramitando na Câmara Federal com o intuito de sustar o decreto da presidência (um de autoria dele), mas que eles permanecem “engavetados” pela presidência daquela Casa. Outro caminho indicado por ele foi o de apresentar para a sociedade os efeitos negativos do decreto em relação à participação social nos conselhos.

Por fim, Iriny fez um balanço da audiência pública. Para a parlamentar, o governo federal tem uma postura autoritária, típica de quem quer acabar com a democracia no país. “Antes eram tanques nas ruas. Hoje é censura, intervenção nas universidades, matar por incompetência e negacionismo 400 mil pessoas. É voltar para o mapa da fome, querer obrigar a ter aulas presenciais, onde é um foco de contaminação. O autoritarismo hoje está vestido com outras roupas, mas é o mesmo da classe dominante atrasada que temos em nosso país, que não respeita a autonomia de um povo, de uma nação, que se constrói com as vidas dedicadas à construção dessa democracia”, concluiu.

Por Gleyson Tete


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