Agricultores familiares precisam adotar medidas para lidar com as mudanças do clima, aponta estudo

Realizada no âmbito do projeto Cinturão+Verde, pesquisa do FGVces realizou um diagnóstico do grau de vulnerabilidade e de exposição dos pequenos produtores da região do Alto Tietê, em São Paulo, às ameaças climáticas

Foto: FGV

A região do Alto Tietê, em São Paulo, constitui um dos principais polos de produção de hortaliças do país. Essa produtividade, contudo, está ameaçada em função dos efeitos das mudanças climáticas globais, que alteraram a frequência e a magnitude dos eventos extremos de seca e cheia. Além de colocar o cultivo e o abastecimento de alimentos em risco, esse cenário também tem potencial para afetar negativamente o sustento de centenas de agricultores familiares, que têm a atividade agrícola como sua principal ou única fonte de renda, indica o estudo “Adaptação às mudanças climáticas pela agricultura familiar no Cinturão Verde de São Paulo”, realizado pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces), com recursos da Citi Foundation e a parceria do Citi.

O documento integra o projeto Cinturão + Verde, cujo objetivo é promover a adaptação às mudanças do clima entre agricultores familiares da região do Cinturão Verde de São Paulo.

Realizado ao longo de 13 meses, o projeto piloto se concentrou na sub-bacia Cabeceiras, inserida na Bacia Hidrográfica Alto Tietê, que compreende 10 municípios, sendo eles: Salesópolis, Biritiba-Mirim, Mogi das Cruzes, Suzano, Poá, Itaquaquecetuba, Ferraz de Vasconcelos, Arujá, Guarulhos e São Paulo.

Principais resultados

Os pesquisadores fizeram uma análise de risco climático considerando três dimensões: vulnerabilidade, exposição e ameaça climática (leia mais sobre a metodologia abaixo). Em relação à “ameaça climática”, o levantamento confirmou o aumento da frequência de eventos extremos, fenômenos observados e relatados pelos agricultores familiares que participaram do projeto piloto. Confira alguns destaques da análise, que abrange os períodos de 1980 a 2013 (para os valores de temperatura máxima, temperatura mínima e evapotranspiração) e 1980 e 2015 (para os dados de precipitação:

– Chuva intensa

Entre 1980 e 2015, se observou uma tendência dos eventos de chuva extrema se tornarem mais intensos, sobretudo na região central de São Paulo e em direção ao leste do município, abrangendo também os municípios de Poá, Ferraz de Vasconcelos, Suzano;

– Dias secos

Considerando o mesmo período, notou-se um aumento considerável de dias secos ao longo do ano em quase todo o território da bacia do Alto Tietê, com destaque a região leste do município de São Paulo, além de Poá, Ferraz de Vasconcelos, Suzano e Mogi das Cruzes. Em 36 anos, o aumento da quantidade de dias sem chuva em um ano foi da ordem de 13 a 20 dias, aproximadamente. A combinação entre o aumento da chuva intensa com o aumento concomitante dos dias secos, como é o caso da região entre a porção central de São Paulo e município de Suzano, indica a intensificação dos eventos climáticos extremos;

– Temperaturas máximas e mínimas

A análise dos indicadores confirmou, de maneira geral, um aumento consistente das temperaturas máximas e mínimas na região para ambas as variáveis, demonstrando incrementos consistentes ao longo de todo o território. Para a temperatura máxima média, além da tendência de variação ser positiva em todos os municípios considerados, ela cresce gradativamente em direção à parte mais a leste da bacia. Nessa região, a exemplo do município de Salesópolis, nos últimos 33 anos, a temperatura máxima média teve um aumento de aproximadamente 2,2 °C. A temperatura mínima segue um padrão similar, tanto a frequência de dias frios está diminuindo como o percentual de dias em que a temperatura mínima esteve abaixo de 10°C está diminuindo em 7,3% para o agregado da bacia. Logo, os dias frios estão ficando menos frios;

– Temperaturas extremas

De acordo com os resultados obtidos, além de a média aumentar, também está aumentando a magnitude dos eventos de temperatura extrema, no caso, a frequência dos dias com temperaturas extremas. A análise do percentual de dias com a temperatura acima de 30 graus demonstrou que, para a bacia do Alto Tietê, em 33 anos, houve um aumento médio de aproximadamente 12% no número de registros diários que ultrapassaram essa marca.

Juntamente com a intensificação dos eventos climáticos extremos, foram observados riscos nas outras duas dimensões analisadas.

Um dos exemplos é o fato de a produção agrícola estar concentrada em poucas culturas; em geral, culturas mais vulneráveis a variações e extremos climáticos, como a alface. São outros: a inadequação do sistema de irrigação às demandas da região; a dependência dos agricultores à renda advinda da produção agrícola; a ausência de programas governamentais direcionados a eventuais impactos climáticos na agricultura da região; e a pressão da urbanização sobre as áreas rurais.

“A partir dessa metodologia, entendemos que os impactos das mudanças climáticas não se dão de forma isolada. Os problemas podem se tornar mais ou menos intensos, a depender da vulnerabilidade das pessoas e dos sistemas e da exposição ou não a eventos com potencial para gerar perdas e danos”, explica Samuel de Mello Pinto, pesquisador do FGVces.

Metodologia

A fim de compreender a suscetibilidade do território da bacia do Alto Tietê às mudanças climáticas, foi realizada uma análise de risco climático considerando três dimensões: vulnerabilidade, exposição e ameaça climática.

Para entender as dimensões de “vulnerabilidade” e ”exposição”, a equipe de pesquisa analisou indicadores socioterritoriais, ou seja, dados sobre as características da produção agrícola do território, do produtor, da existência de organizações produtivas, como associações e cooperativas, dos diferentes usos do solo, entre outros.

Já na dimensão de “ameaça climática”, foram avaliadas quatro variáveis climáticas, obtidas a partir de uma base de dados de valores diários, interpolados para todo o território brasileiro, para um período de 30 anos. São elas: precipitação, temperatura máxima, temperatura mínima e evapotranspiração – esta última servindo de insumo para o cálculo do balanço hídrico climatológico.

O projeto Cinturão+Verde também envolveu um trabalho em campo com dez grupos de agricultores. Foram realizadas oficinas e uma série de atividades de engajamento, sensibilização e interação, ao longo das quais também foram apresentadas sete experiências exitosas de adaptação às mudanças climáticas por agricultores familiares.

Da Redação | Fonte: FGV


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